Especial Fitzgerald: "O curioso caso de Benjamin Button" (1922)
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O filme O Curioso Caso de Benjamin Button (2008, créditos: Warner Bros.) foi baseado no conto homônimo de F. Scott Fitzgerald. |
O Curioso Caso de Benjamin Button: o conto
"É uma pena que a melhor parte da vida aconteça no começo dela e a pior parte no seu fim." (Mark Twain).
Inspirado pela frase de Mark Twain, o escritor F. Scott Fitzgerald criou a história de O curioso caso de Benjamin Button (The curious case of Benjamin Button), publicada em 1922, junto com uma coleção de contos Tales of the Jazz Age.
Essa história começa em agosto de 1860, na cidade de Baltimore, em Maryland, Costa Leste americana, com a chegada de Benjamin Button ao mundo apresentando, no entanto, uma peculiaridade: diferente dos demais humanos, ele nasceu aparentando, pensando e falando como um homem com cerca de 70 anos de idade, o que assustou não só os seus pais, o Sr. e a Sra. Button, como médicos e enfermeiras do Maryland Private Hospital for Ladies and Gentleman e a sociedade local. O "bebê" Button, que não só parecia como tinha todos os problemas de saúde de um idoso, por pouco, não foi batizado com o nome de Matusalém (o que mostra que Fitzgerald também tinha uma veia cômica, quando assim queria).
As pessoas que foram visitar a família Button, na Monroe Street, para parabenizar pelo novo membro, ao invés de dizer que o garotinho parecia com o pai ou a mãe, falaram que ele parecia com o avô, o que não agradou o velho Button. Porém, com o passar dos dias e meses, neto e avô se deram tão bem que se tornaram grandes amigos, discutindo assuntos que só homens da idade deles poderiam compreender.
O tempo passou e, ao invés de envelhecer mais, Benjamin rejuvenesceu. Aos 50 anos ele e seu pai pareciam irmãos e iam às festas locais juntos. Numa delas, o 'jovem' Button se apaixonou por Hildegard Moncrief, uma garota de 20 e poucos anos, desejada pelos belos rapazes de então, mas que tinha uma queda por homens mais velhos. Ela se encantou com Benjamin e, a contragosto de sua família, dos amigos e da sociedade, casou-se com ele. Em pouco tempo, tiveram seu único filho, Roscoe Button.
Por causa de sua aparência de cinquentão, Benjamin foi rejeitado pela Yale University, que não acreditava que sua idade biológica fosse somente 18 anos. Isso fez com que o homem voltasse a sua atenção para os negócios da família, a fábrica Roger Button & Co., Wholesale Hardware, fazendo-os prosperar ainda mais. Três décadas depois, quando aparentava ser um jovem de 20 e poucos anos, ele conseguiu ingressar na Universidade de Harvard.
À medida em que ficava mais jovem e sua mulher envelhecia, Benjamin perdia o interesse físico por ela e ficava atraído por garotas mais jovens. Vendo que a situação genética dele era irreversível, Hildegard foi viver na Europa, deixando marido e filho, já homem feito, na América. Foi com Roscoe e sua esposa que Benjamin atingiu a fisionomia e mentalidade de uma criança, chegando a brincar com seu próprio neto de igual para igual. As últimas lembranças do personagem foram as do rosto de sua babá, Nana.
Curioso Caso de Benjamin Button: o filme
Sob a direção de David Fincher, a versão criada para o cinema da história de Benjamin Button (Brad Pitt) começa em 1918, na cidade de Nova Orleans e numa noite de muita festa, devido ao final da I Guerra Mundial. Sua mãe, Caroline Button (Joeanna Sayler), morre após o parto. O Sr. Roger Button (Jason Flemyng), arrasado pela perda da mulher amada e da aparência envelhecida do recém-nascido, decide livrar-se dele, abandonando-o na porta de um asilo.
O bebê com aparência de septuagenário é resgatado por Queenie (Taraji P. Henson), a cuidadora da casa de retiro para idosos. Ao consultar um médico, a mulher é assegurada de que aquela criatura tem todos os problemas físicos de uma pessoa em estágio terminal, aconselhando-a a entregá-la para uma instituição mais apropriada. Mas, a religiosa Queenie decide criar o garotinho, enquanto ele respirar, e o batiza com o nome de Benjamin.
Surpreendendo a todos no asilo, que o vêem como um igual, Benjamin fica cada dia mais forte, suas articulações melhoram e seu cabelo, antes branco e ralo, começa a aparecer e a ficar grisalho.
Um dia, quando começa a andar de muletas, o menino conhece a pessoa que se tornará o amor de sua vida: Daisy Fuller (interpretada por Elle Fannig), uma menina de sete anos de idade e neta de uma das moradoras do asilo, a Sra Fuller (Phyllis Somerville). De cara, Daisy percebe que aquele idoso tem alma de criança e gosta da companhia dele.
Os anos passam e chega o dia em que Benjamin consegue um emprego na embarcação Chelsea, do Capitão Mike (Jared Harris), um homem cujo maior desejo na vida era ser um artista e que se torna uma espécie de figura paterna para o rapaz. Quando descobre que Benjamin nunca esteve com uma mulher, o capitão decide levar o "idoso" a um bordel para ele, finalmente, perder a virgindade.
Na mesma noite, Roger Button, que acompanhava a evolução do filho de longe e também estava no bordel, oferece-lhe uma carona e tenta se aproximar dele, mas sem revelar a sua identidade. Isso só acontece quando Benjamin volta da Europa, no final da II Guerra Mundial. O rapaz fica triste em saber o que motivou o seu abandono, mas decide perdoar o pai. A cena que mostra ele fazendo isso é uma das mais bonitas do filme: numa madrugada, após uma tempestade, ele leva o inválido Sr. Button para ver o sol nascer no píer da casa de férias da família, no lago Pontchartrain.
"Quando eu era garoto, adorava acordar antes de todo mundo, correr até o lago e ver o sol nascer. Era como seu eu fosse a única pessoa viva." (Roger Button)
Antes do momento entre pai e filho, Benjamin viveu uma outra experiência interessante, só que na Rússia, onde a embarcação de Capitão Mike ancorou por alguns meses. No hotel em que a tripulação se hospedou, Benjamin conheceu Elizabeth Abbott (Tilda Swinton), esposa do espião britânico Walter Abbot (David Ross Paterson). Insones, Benjamin e Elizabeth se encontravam na cozinha do hotel, onde tomavam chá e conversavam sobre a vida. Eventualmente, eles se tornaram amantes. Porém, a guerra acabou separando os dois e cada um voltou para a sua vida anterior.
Em paralelo, Daisy (interpretada por Cate Blanchett) se tornou uma bailarina profissional e começou a se apresentar na Broadway, em Nova York, e, depois, nos palcos do mundo. Ela e Benjamin se correspondiam regularmente e chegaram a se encontrar algumas vezes, mas um relacionamento entre os dois parecia ser algo que nunca daria certo. Finalmente, chegou o dia em que eles se entenderam e decidiram ficar juntos.
Ciente do fato de que Benjamin se tornava cada dia mais novo, o casal decide aproveitar, intensamente, o período da vida que em tinham idades parecidas, antes que ela ficasse velha demais e que ele passasse a usar fraldas de bebê. E assim o fazem. Nesse ínterim, Queenie, já idosa, falece e sua filha (Deneen Tylor) assume a gestão do asilo.
Sobre o restante do filme, para não tirar a surpresa de quem ainda não o viu, eu só posso dizer que se trata de uma daquelas fantasias dramáticas e românticas belíssimas que o cinema produz, de tempos em tempos, tanto que ele foi indicado a 160 prêmios, ganhando 85 deles (incluindo 3 Oscars).
O Curioso Caso de Benjamin Button: locações em Montreal
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Dois locais da Rue Saint-Paul, na Vieux-Montreal, exibidos no filme como sendo localizados na Rússia e em Paris (fotos: Fran Mateus). |
A maior parte das filmagens de O Curioso Caso de Benjamin Button (2008) se concentraram em locações de Nova Orleans, nos Estados Unidos, e em Montreal, no Canadá.
As cenas canadenses foram filmadas no bairro de Vieux-Montréal, o centro antigo da cidade, com destaque para a Rue Saint-Paul (foto acima), uma rua longa e dividida entre leste e oeste, usada para ambientar os acontecimentos ocorridos na Rússia e, depois, em Paris:
- Na versão russa da rua, filmada em sua parte leste, Elizabeth leva Benjamin para uma caminhada fora do hotel, numa madrugada de muita neve. Quando eles param na esquina com a Rue Bonsecours (foto acima), ela percebe que ele está congelando de frio e sugere que voltem para o hotel. Essa será a primeira noite de amor dos dois.
- Na versão parisiense da rua, rodada na parte oeste, ela é exibida quando Benjamin explica como um minuto a mais ou a menos, pode mudar o destino de alguém; no caso, uma série de acontecimentos que culminam com o acidente de uma personagem. A foto acima foi tirada na altura do prédio cujo relógio é mostrado para marcar o momento do ocorrido.
Em Nova Orleans, a principal locação é a casa de retiro onde Benjamin Button é criado e vive a maior parte da vida. A casa exibida no filme é chamada de Nolan House e fica no 2707 Coliseum Street, no Garden District. Saiba mais sobre o local através deste post, publicado no blog New Orleans Historical.
O Curioso Caso de Benjamin Button: comentários
A adaptação do conto para o cinema manteve a ideia apresentada por Fitzgerald, de um homem que vive o ciclo da vida ao contrário — nasce velho, fica adulto e jovem até se tornar um bebê — e uma ou outra ideia do conto. Mas as semelhanças, praticamente, param por aí, visto que o roteiro escrito por Eric Roth e Robin Swicord tomou muitas liberdades artísticas em relação ao tempo e local em que as coisas acontecem e nas relações entre os personagens.
No conto, a história é narrada em terceira pessoa. No filme, ela é contada através de narrações do próprio Benjamin e da leitura do diário dele por Carolina (Julia Ormond), com uma conclusão dos acontecimentos apresentada por Daisy, já idosa e no leito de um hospital esperando o seu fim.
Apesar das mudanças, o resultado deste filme ficou excelente, diferente do que acontece com tantas outras adaptações para o cinema. É impressionante ver o cuidado com que o texto de Fitzgerald foi tratado pelos roteiristas e transferido para a tela. Quero acreditar que o escritor ficaria bem satisfeito.
Além de uma boa história, outro ponto forte do filme é o seu elenco, tanto principal como coadjuvante; parte dele, indicado a prêmios importantes por esse trabalho. Falando sobre a performance de Brad Pitt, a impressão que me deu foi a de que o ator nasceu para fazer esse papel (pelo qual recebeu a indicação para o Oscar de Melhor Ator). Depois de vê-lo como Benjamin Button (olhar e gestos comedidos e voz que transmite tristeza e esperança ao mesmo tempo), eu não consegui pensar em ninguém melhor. O ator está, simplesmente, perfeito!
Resumindo, quando você quiser conhecer a história tal como ela foi escrita por Fitzgerald, com seus detalhes reflexivos, mas muito divertidos, leia o conto. Eu sempre dou boas gargalhadas quando faço isso. E quando você quiser ver uma bela história de vida e de amor na tela (tanto entre Benjamin e Daisy, como entre ele e sua mãe de criação), assista o filme. Serão quase três horas de puro entretenimento.
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Confira o texto do conto e da coletânia Tales of the Jazz Age no site Project Gutenberg.
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